O Brasil se encontra em posição privilegiada para atender à crescente
demanda mundial por alimentos, notadamente da Ásia: tem terras aráveis,
recursos hídricos, tecnologia e empreendedorismo. Porém o alto custo do frete e
a ineficiência do sistema de transporte têm sido um importante óbice ao
aproveitamento dessa oportunidade de mercado. Para ganhar em competitividade, o
escoamento de grandes volumes de produção de grãos do Centro-Oeste do País até
os portos de exportação precisaria utilizar a hidrovia de forma intensiva.
No Brasil, as hidrovias transportam apenas 4% das cargas nacionais. No
caso da cadeia produtiva da soja, a principal cultura agrícola do País, cerca
de 70% do transporte é feito por rodovias, o que reduz a renda do produtor
rural, porque o frete rodoviário é o mais oneroso em relação aos modais
ferroviário e hidroviário. Nos EUA ocorre quase o inverso, já que 61% da soja
exportada utiliza as hidrovias, vantagem que confere competitividade
internacional à produção daquele país. Na Europa, as hidrovias são utilizadas
intensivamente na distribuição de produtos.
O Brasil tem 63 mil km de rios. Desses, 43 mil km são navegáveis, mas
27,5 mil ainda não têm sido efetivamente utilizados. A hidrovia é o caminho
mais barato para o escoamento da produção agrícola do País. Por isso a cadeia
produtiva da soja defende que a construção de novas hidrelétricas venha sempre
acompanhada de eclusas, comportas que funcionam como elevadores de água e que
fazem as barcaças e os navios subirem e descerem para transpor as barragens
erguidas pelo homem nos rios, permitindo a navegação fluvial.
A construção da eclusa de Tucuruí é considerada um exemplo de como a
falta de um marco regulatório específico, que obrigue a construção concomitante
de eclusas para conciliar o uso múltiplo das águas, prejudica o desenvolvimento
social e econômico de uma região. Foram necessários 15 anos para pôr a eclusa
em funcionamento, período em que a produção da região dependeu apenas do
transporte rodoviário, mais caro e sujeito às condições precárias de manutenção
das rodovias brasileiras.
Não podemos desperdiçar o grande potencial de escoamento de granéis e
outros produtos por rios como o Tocantins, o Araguaia, o Teles Pires e o
Tapajós. Causam preocupação os projetos de usinas hidrelétricas no Rio
Tocantins e no Teles Pires, que, se construídas sem eclusas, inviabilizarão o
escoamento da produção de uma extensa área agrícola sob influência da hidrovia.
Essa região, assim como outras, ficará dependente do dispendioso transporte
rodoviário.
Existem projetos no Ministério de Minas e Energia para implantar, até
2018, três hidrelétricas no Rio Tapajós - uma em São Luiz do Tapajós; uma em
Jatobá; e outra em Chacorão -, porém sem prever a construção de eclusas.
Informações do Movimento Pró-Logística (integrado por entidades
mato-grossenses, entre elas a Famato, a Aprosoja, a Acrimat e a Ampa) indicam
que será possível gerar energia e permitir a navegação na Hidrovia Teles
Pires-Tapajós a um custo de R$ 2 bilhões, economizando para os produtores
outros R$ 2 bilhões por ano em fretes.
Atualmente, 27 eclusas são consideradas prioritárias em projetos de
barragens e em barragens já construídas que exigem recursos de aproximadamente
R$ 11,6 bilhões. A construção de eclusas depois de feita a barragem é muito
mais cara e complexa. O valor de uma eclusa construída junto com a obra de uma
hidrelétrica representa 7% do valor total da usina. Uma eclusa feita
isoladamente passa a custar 30% do valor da hidrelétrica. Portanto, o ideal é
que eclusas sejam incluídas no planejamento de hidrelétricas e construídas ao
mesmo tempo.
Felizmente, o assunto tem sido objeto de recentes debates entre as
partes interessadas no Congresso Nacional. No dia 21 de maio foi apresentado,
na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara dos
Deputados, um novo substitutivo ao Projeto de Lei n.º 3.009/97, que estabelece
a obrigatoriedade da inclusão de eclusas e de equipamentos e procedimentos de
proteção à fauna aquática dos cursos d'água na construção de barragens.
O relator do projeto, deputado Homero Pereira (PSD-MT), apresentou
parecer na forma de substitutivo em que promove, entre outras, as seguintes
alterações: explicita que a norma estabelece a obrigatoriedade de implantação
integral ou parcial de eclusas ou outros dispositivos de transposição de
desnível de forma concomitante ou posterior à implantação de barragens em
cursos d'água; permite que a empresa responsável pela construção e operação da
barragem seja ressarcida pela União pelos custos relativos ao projeto executivo
e à construção da eclusa; veda a transferência desses custos à tarifa de
energia elétrica, no caso de barramento para aproveitamento hidrelétrico; e
exige que, no caso de licitação para aproveitamento hidrelétrico do curso d'água,
o edital explicite que o projeto e a implantação da barragem deverão ser
compatíveis com a construção de eclusas.
A Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) e a
Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja) destacam a
necessidade de um planejamento integrado entre os vários órgãos governamentais,
como o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), do
Ministério dos Transportes, a Agências Nacional de Águas (ANA), a Agência
Nacional de Energia Elétrica (Aneel), a Agência Nacional de Transportes
Aquaviários (Antaq) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis (Ibama). Com isso, ao ser aprovada a legislação que
estabelece a obrigatoriedade da inclusão de eclusas na construção de barragens,
todos os atores estarão preparados para implementar o que deverá ser um dos
principais saltos em matéria de logística no Brasil.
Com a viabilização das hidrovias, ganham o setor produtivo e,
especialmente, a sociedade, com a geração de empregos, renda, desobstrução das
rodovias e redução das emissões associadas ao transporte por caminhões.
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