A
Polícia Federal abriu inquérito para investigar as causas do assassinato do
índio da etnia Munduruku morto durante uma ação da operação Eldorado que
terminou em confronto entre agentes da PF e indígenas da aldeia Teles
Pires, na região de Alta Floresta, a 800 quilômetros de Cuiabá nesta última
quarta-feira (7).
O corpo
do indígena, que seria pai de oito filhos, foi encontrado um dia depois
pelos próprios indígenas boiando no rio Teles Pires. Nesta sexta-feira (9),
em coletiva à imprensa, o superintendente da PF em Mato Grosso, César
Augusto Martinez, informou que um boletim de ocorrência foi registrado na
delegacia de Jacareacanga, cidade do Pará que faz divisa com Mato Grosso.
“Ele teria sido até enterrado. Mas nós já iniciamos uma investigação
conjuntamente com a Secretaria de Segurança do Pará para apurar o caso”,
afirmou o delegado. Depois de encontrado, relatou Martinez, o corpo terá
que ser exumado.
No
confronto, segundo o superintendente, um dos três delegados que comandou a
operação na região, disse em depoimento à PF, que foi perseguido por um
indígena no rio Teles Pires e teria disparado. “Ele estava com a água já
pelo peito e depois de ser atingido por uma borduna e alvejado por flecha ele
disse que foi perseguido por dois índios. Ele efetuou um disparo que pode
ou não ser de arma de fogo. Ele não soube precisar. Estamos investigando se
o índio que morreu foi alvejado por ele”, relatou.
O
superintendente relatou que os policiais federais foram vítimas de uma
emboscada. No dia anterior à ação, os agentes da PF e as lideranças da
aldeia Teles Pires, pertencente ao povo Munduruku, fecharam acordo de que
as balsas utilizadas no leito do rio para a extração ilegal de ouro seriam
destruídas. “A reunião durou quatro horas e deixamos claro que os índios
não estavam sendo investigados naquele momento. No outro dia quando os
policiais chegaram para explodir as balsas foram surpreendidos com mais de
100 índios atirando flechas”, informou.
Ainda de
acordo com Martinez, um áudio que vai compor o inquérito da PF dá conta que
os índios se prepararam para o confronto. “Eles arregimentaram guerreiros e
o líder da aldeia chegou a dizer: é para bater ou matar”, destacou o
superintendente.
O
coordenador da Fundação Nacional do Índio (Funai) em Alta Floresta, Clóvis
Nunes afirmou que, possivelmente, o conflito só ocorreu porque os índios
não querem que o garimpo deixe as suas terras. “Lá existe atividade
garimpeira feita no leito do rio. Muitas dragas e balsas atuam na região e
os índios recebem uma porcentagem dos lucros obtidos pelos garimpeiros”,
destacou Nunes.
No
conflito, os policiais federais portavam tanto balas letais como
não-letais. Além do indígena morto, outros seis ficaram feridos. Dois
deles, em estado mais grave, foram transferidos de helicóptero,
primeiramente, para Alta Floresta e, em seguida, para o Pronto-Socorro de
Cuiabá. Um deles, de 44 anos, está com um dreno instalado no braço atingido
por um disparo. Ele corre risco de ter o membro amputado. Eles também foram
submetidos a exame de corpo de delito que vai apontar, dentre outros
pontos, se há resíduo de pólvora nos ferimentos.
Outros
quatro policiais também se feriram. Um deles, da Força Nacional de
Segurança, foi baleado. Todos os agentes foram atendidos no local e estão
em estado de observação porque, segundo a PF, as bordunas que os atingiram
poderiam conter alguma substância que causaria dano à saúde.
Invasão
de três mil índios
A
Polícia Federal desmontou a base que mantinha em uma fazenda e deslocou 92
agentes para a cidade de Alta Floresta. Tudo porque escutas via rádio e
conversas informais entre os indígenas dão conta de que quase três mil
índios preparam uma invasão à cidade de Alta Floresta em retaliação ao
confronto na aldeia.
O superintendente
informou à imprensa que só irá retirar os agentes da cidade quando a
hipótese de invasão for dissipada. “Três mil pessoas é muito complicado.
Para reunir toda essa gente precisa de tempo e estrutura. Mas continuamos
na cidade com a nossa tropa de choque”, acentuou Martinez.
Ao longo
desta quinta-feira (8), um grupo de 17 índios envolvido no conflito prestou
depoimento à PF, em Sinop, a 500 quilômetros de Cuiabá. Treze deles foram
autuados por desacato e resistência e poderão responder pelos crimes,
segundo o superintendente da PF, porque são índios aculturados. Outros
quatro não foram autuados porque são menores de idade. Quinze armas de
diversos calibres, além de bordunas, arcos, flechas e facões foram
apreendidos e serão submetidos à perícia.
De
acordo com a PF, os índios recebiam R$ 420 mil por mês obtidos pela
garimpagem ilegal de ouro na região. Cada balsa empregada no garimpo,
segundo Martinez, custou R$ 2,5 milhões. “A aldeia é bem estruturada. Tem
geladeira, fogão elétrico, gerador, balsas e carros”, salientou Martinez.
O
superintendente afirmou ainda que a operação Eldorado, apesar de ter sido
interrompida após o conflito, encerrou a primeira fase que se ateve a
coibir crimes financeiros e ambientais. Ele classificou a ação como
positiva porque todas as 16 balsas usadas na extração ilegal de ouro no rio
Teles Pires foram explodidas. A Justiça Federal de Mato Grosso expediu 28
mandados de prisão e 64 de busca e apreensão em Mato Grosso e outros seis
estados. Agora, a operação vai entrar na segunda fase quando os crimes de
lavagem de dinheiro serão apurados. Nessa fase, os índios serão
investigados.
Truculência
da PF
O
Conselho Indigenista Missionário (Cimi) classificou, por meio de nota, a
ação policial como truculenta. Segundo o conselho, durante a presença dos
agentes, a aldeia ficou sitiada. A nota salientou a disparidade entre o
armamento usado pelos policiais com o dos indígenas que estariam com arco e
flecha artesanais.
O Cimi
destacou ainda que a aldeia não mantém atividade garimpeira em suas terras.
A informação contrapõe as investigações da PF que apontaram, ao longo de 10
meses, que os indígenas estariam envolvidos no esquema criminoso.
O
Ministério Público Federal (MPF) também acompanha o caso e solicitou
informações sobre a operação à presidente da Fundação Nacional do Índio
(Funai), Marta Maria do Amaral Azevedo, e ao superintendente da Polícia
Federal, César Augusto Martinez. O comunicado do MPF pede que as
informações contenham as medidas que foram tomadas pelos órgãos para a mediação
do conflito.
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